O futuro dos planos de saúde no Brasil está em xeque. Projeção da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) mostra que – considerando as mesmas taxas de cobertura por faixa etária verificadas em 2016 – haverá um consumidor jovem (zero a 18 anos) para cada beneficiário idoso (59 ou mais) do serviço em 2027. Para ter ideia do agravamento desse quadro, em 2000, haviam três jovens para cada idoso. Em 2015, essa variação era de dois para um.
“Levando-se em conta o envelhecimento da população, a queda drástica da taxa de fecundidade e a estrutura engessada da oferta de serviços da saúde suplementar, há severas ameaças à sustentabilidade do setor. Na forma como funciona hoje, o financiamento entre gerações correrá risco por conta da mudança dessa proporção. Cada vez temos menos gente jovem na assistência à saúde privada para exercer solidariedade com os mais idosos. Diante desse quadro, precisamos atuar em outras frentes para manter viável a assistência privada, como flexibilizar as regras que paralisam o mercado e poder disponibilizar mais produtos e, assim, atender a diversos nichos da população, de acordo com suas características e necessidades”, afirma Solange Beatriz Mendes, presidente da entidade.
A adequada proporção entre jovens e idosos é um dos preceitos que rege a sustentabilidade econômica dos planos de saúde – sistema de mutualismo. A técnica do seguro recomenda que os beneficiários de cada faixa etária arquem solidariamente com a totalidade dos custos de seu respectivo grupo. No entanto, as regras de formação de preços dos planos e seguros de saúde fixaram uma relação entre o preço da primeira faixa etária e da última, de seis vezes. Como a proporção de despesas médias dessas faixas é maior do que seis vezes, é estabelecido implicitamente um apoio financeiro dos menores de 59 anos de idade – pagando uma mensalidade um pouco acima de seus custos para que os idosos não sejam excessivamente onerados, o que seria o caso se compartilhassem as despesas com assistência à saúde apenas entre esse grupo. Dessa forma, os idosos podem manter o plano de saúde, apesar da elevação das despesas médicas com o avanço da idade.
De 1940 a 2015, a esperança de vida ao nascer no Brasil para ambos os sexos passou de 45,5 anos para 75,5 anos, um aumento de 30 anos, segundo o IBGE. Projeções do Instituto mostram que a população com 59 ou mais anos de idade vai triplicar no Brasil e passará de 26,8 milhões (13,0% da população brasileira), em 2016, para 65,9 milhões de pessoas, em 2050 (29,2%). As estimativas são de que a “virada” no perfil da população acontecerá em 2030, quando o número absoluto de brasileiros com 60 anos ou mais de idade irá ultrapassar o de crianças de 0 a 14 anos. Daqui a 13 anos, os idosos chegarão a 41,5 milhões (18% da população) e as crianças serão 39,2 milhões, ou 17,6%.
Crise acentua desequilíbrio
“O setor de saúde suplementar é intrinsicamente ligado à economia, à geração de emprego e renda. Atualmente, aproximadamente 66% dos vínculos contratuais são de coletivos empresariais, principal forma de aquisição de um plano de saúde por parte dos jovens na vida ativa. O desemprego tem impacto direto no segmento de planos de saúde, mas, independentemente da crise, precisamos encontrar alternativas para facilitar o acesso ao serviço por parte dos mais jovens, para manter o equilíbrio do mutualismo. Hoje, já vivemos o impacto da transição demográfica e os desafios impostos com essas mudanças”, explica Solange Beatriz.
Os diversos agentes de saúde precisam se adaptar às alterações em curso. As políticas de financiamento dos sistemas de saúde e da infraestrutura requerida também precisam acompanhar essas modificações, que irão requerer regulações adequadas para que tanto o setor público quanto o privado sejam viáveis diante do aumento das despesas médicas e previdenciárias. Exemplo prático é a necessidade de restruturação da infraestrutura física de todos os serviços, principalmente os de assistência à saúde, e de uma nova composição das especialidades profissionais, com mais ênfase em geriatria.
“O aumento da longevidade é uma conquista da sociedade. Mas, ao mesmo tempo, é inevitável o crescimento por demanda de assistência médica, já que, invariavelmente, os idosos precisam de mais cuidados. Hoje, o setor de Saúde Suplementar é uma opção concreta e segura para os idosos”, avalia Solange Beatriz. Em 2016, o total de beneficiários de planos de saúde com 59 anos ou mais cresceu 1,6% em comparação ao ano anterior, totalizando 6,6 milhões de consumidores. Esse crescimento segue na contramão do mercado, que registrou queda de 2,8% no ano passado.
Segundo projeções do Instituto de Estudos da Saúde Suplementar (IESS), mantida a atual taxa de cobertura média dos planos de saúde para o conjunto dos brasileiros (cerca de 25% da população), a proporção de beneficiários idosos, no estrato de 59 anos ou mais, saltará de 12,3%, em 2015, para 20,5%, em 2030. No mesmo período, em paralelo, haverá um crescimento de 105% no volume de internações de beneficiários com 59 anos ou mais, saltando de 2 milhões para 4,1 milhões ao ano. Outro avanço exponencial se dará nas consultas desse grupo, na ordem de 100,9%: de 43,1 milhões ao ano, em 2015, para 86,6 milhões ao ano, em 2030. O total de exames deve crescer 101,9%, de 204 milhões anuais para 411,8 milhões ao ano, seguido pela alta de 102,3% das terapias (de 25,6 milhões ao ano para 51,8 milhões ao ano).
Associadas investem em cuidado integral
Uma iniciativa relevante é da NotreDame Intermédica, com o Programa de Assistência ao Idoso (PAI). Com 10.518 beneficiários inscritos com mais de 60 anos, o cuidado integrado é centralizado no atendimento em Unidades de Prevenção com infraestrutura adequada para o alto risco. O atendimento médico é composto por geriatras com suporte de equipe multiprofissional (enfermagem, nutricionista, psicóloga, fisioterapeuta e fonoaudióloga), que conta ainda com pré-consulta de enfermagem e grupos de apoio para pacientes e familiares. Dentre as ações, sessões de fisioterapia voltadas à prevenção de quedas, com foco no fortalecimento muscular e na reabilitação, além de cuidadores de pacientes com Alzheimer e encontros semanais e quinzenais com especialistas para tratar de diversos temas, como quimioterapia, depressão, ansiedade, memória, atividade física e alimentação.
O resultado do programa é a menor internação devido ao cuidado da equipe multiprofissional, atuando de maneira coordenada nas múltiplas doenças do mesmo paciente. Para ter ideia da melhora no atendimento ao idoso, a taxa de internação vem diminuindo ao longo dos anos. Em 2004, eram, em média, 5,14 pacientes internados por dia a cada mil beneficiários na cidade de São Paulo e na região do ABC. Em 2016, essa taxa caiu para 2,10. Exemplo desse cuidado integrado foi a redução de 40% nos casos de fratura de fêmur, além de uma queda de 23% nas consultas ambulatoriais e 5% nas consultas de pronto-socorro, após o primeiro ano de adesão ao programa.
Já o projeto de atenção ao idoso da Amil engloba desde o monitoramento da saúde dos pacientes por meio de ligações periódicas a terapias individuais e em grupo, em uma unidade de saúde localizada na Tijuca – bairro com o segundo maior índice de população idosa no Rio de janeiro. Escolhido como um dos projetos do Programa ‘Idoso bem cuidado’, da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a iniciativa prevê o atendimento a mais de mil beneficiários maiores de 60 anos. A atuação consiste em concentrar todo o suporte necessário para a atenção ao idoso em um único lugar, onde médicos de família, enfermeiros, agentes comunitários de saúde, psicólogos, fisioterapeutas, geriatras e nutricionistas formam equipes exclusivas que acompanham cada idoso de forma mais próxima e de maneira integrada. Questões como envelhecimento, déficit de memória e luto entram no planejamento das equipes de saúde como temas a serem tratados durante as consultas, os contatos e os encontros realizados. A proposta é que, ao ingressar no programa, o idoso sinta-se parte de um verdadeiro clube, e não apenas em mais uma unidade de saúde – por isso, o local de atendimento leva o nome de Clube Vida de Saúde.
Fonte: Revista Apólice
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